Sunday, December 30, 2007

De Nápoles

Sinto-me na obrigação de falar da cidade, sim também antes de reescrever um ano e tal de bolg (que raio de ideia a minha!). Não mudou a minha vida, pois claro, mas não se pode pedir tal coisa a uma cidade, aliás, isso não é coisa que se peça a um sítio, por muito que o Rossellini tenha escolhido Nápoles para salvar o casamento da Katherine e do Alex no filme "Viaggio in Italia". Mas percebe-se porque o fez. Em Nápoles, o sentimento subjacente é a esperança, é como se todoa a cidade gritasse: "sim, é verdade, não cabemos todos aqui, não sabemos o que fazer de tanto lixo, de tanto trânsito, de tanta confusão, mas temos a certeza que vai tudo correr pelo melhor". No labiríntico Spaccanapoli, as pessoas amontoam-se nas ruas estreitas, no meio das bancas que vendem todo o tipo de quinquilharia; em Chiaia, as pessoas amontam-se no meio das ruas ilumindas pelas montras caríssimas; em Capodimonte, os carros amontoam-se perante a indiferença do gélido pôr-do-sol; em Garibaldi, os sem abrigo amontoam-se no meio de cobertores; quase por todo o lado amontoa-se lixo; em Sanità, os prédios amontoam-se a pedir reformas. E no entanto, a Duomo ergue-se majestosa; as igrejas obrigam-nos a parar; as livrarias impõe respeito; as catacumbas embaciam os óculos, com os mais de dois mil anos e quinhentos anos de existêcia, tal como as milenares esculturas do Museu Arqueológico Nacional embaciam os olhos. E depois o Vesúvio, sempre ali à espreita a lembrar como a existência pode ser tão insignificante quando confrontada com um monte de cinzas e lava que ele decide expelir, porque sim. E depois Pompeia, que morreu e resuscitou. Pompeia com as casas dos patrícios e dos outros, os mesmos que pisaram aquela pedras que pisei, os mesmo que tiveram filhos como eu, que brincaram como a Bea nas fontes, que comeram pão cosido naqueles fornos, que se deixaram comover naquele teatro, que se embebedaram naquelas tavernas e deleitaram no Lupanare. Pessoas como nós, mas que deixaram um rasto da existência, por causa de uma tragédia. E é sempre a tragédia que deixa as maiores marcas.

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